Deu na revista Época / Fernando Abrucio
As últimas eleições presidenciais foram marcadas pela polarização entre PSDB e PT. Em 2010, haverá uma grande novidade: pela primeira vez desde a redemocratização, Lula não será candidato. Esse fato mudará o jogo? Provavelmente essas legendas continuarão sendo as hegemônicas no processo eleitoral, mas o pós-lulismo ainda não definiu completamente sua feição.
Particularmente, persistem incertezas sobre quem comandará esses polos. Tal decisão deverá sair até março do ano que vem, fazendo com o que os próximos meses ganhem a relevância de uma final de campeonato.
A incerteza maior está na oposição. Nela há dois pretendentes fortes: José Serra e Aécio Neves. Embora Serra continue sendo favorito, Aécio não pode ser descartado. A queda recente das intenções de voto, a demora em se definir como presidenciável, o medo do crescimento da candidatura de Dilma Rousseff e o aceno de setores do DEM para Aécio bagunçaram um cenário que parecia consolidado a favor de Serra.
Não parece que o favoritismo entre os tucanos já tenha mudado de lado, mas pela primeira vez o tempo pode jogar contra Serra. Sua insistência em só se definir em março significa garantir três meses de ruído em torno de sua candidatura. O cenário poderá piorar se Dilma Rousseff crescer mais nas pesquisas, que sairão no começo de 2010. O argumento de que, diante da força do lulismo, só algo novo poderá mudar o rumo da história poderá impulsionar o crescimento do número de apoiadores de Aécio. Entretanto, mesmo nesse cenário mais róseo para Aécio, há várias incógnitas sobre o significado de sua candidatura. É amplamente conhecida sua boa gestão no governo estadual, mas agora ele pretende ser concorrente à Presidência da República. Dessa troca de posições vêm algumas indagações: qual seria sua política econômica – mais próxima de Malan ou dos desenvolvimentistas do PSDB? Com quais partidos Aécio governaria? Qual seria sua diferença de ideias em relação ao colega José Serra? O debate sobre os nomes dos presidenciáveis esconde a falta de ideias claras para o Brasil.
Não pense que a indefinição de nomes e projetos seja exclusividade da oposição. Do lado do governo há dois candidatos: Dilma Rousseff e Ciro Gomes.
Há boas chances de a chefe da Casa Civil ser a candidata única do bloco governista. Para isso, ela não só terá de crescer eleitoralmente, mas seu concorrente dentro do mesmo bloco político terá de reduzir suas intenções de voto – ou, numa situação limite, ser convencido por Lula a não disputar a Presidência. Nenhuma das hipóteses é líquida e certa.
Assim, mantendo a popularidade nos níveis atuais, Ciro ficará tentado a concorrer ao Planalto. Chama a atenção, no entanto, a dificuldade para diferenciar um projeto comandado por Ciro Gomes de outro capitaneado pelo PT. Se Lula centrar o apoio em Dilma, algo bem provável, uma candidatura de Ciro precisará ser justificada não só por sua popularidade, mas também por um posicionamento político específico em relação ao governismo. A ideia de que ele apoiará as coisas boas do atual governo e mudará o que há de ruim peca pela imprecisão. Caso Ciro especifique mais suas discordâncias, isso poderá atrapalhar Dilma.
Claro que Ciro pode lutar positivamente para encontrar uma linha nova dentro da bipolaridade reinante no sistema político. Essa postura tem chances, inclusive, de mudar certos debates que se tornaram falsamente dicotômicos, abrindo a brecha para novas questões.
Foi desse modo que Marina colocou definitivamente o tema da sustentabilidade na agenda do PT e do PSDB, para o bem do país. Mas, se era fácil imaginar o exercício desse papel pela candidata do PV, por ora não se pode dizer o mesmo em relação a Ciro Gomes.
Qual seria sua ideia motriz, que lançaria novas luzes no debate?
As incertezas acerca do significado das candidaturas de Aécio e Ciro não querem dizer que se saiba por completo o que Dilma e Serra fariam se fossem eleitos.
O que se pretendeu aqui foi realçar que o saudável debate sobre nomes deve ser complementado pela apresentação clara das ideias dos presidenciáveis.
Fernando Abrucio é doutor em Ciência Política pela USP, professor da Fundação Getúlio Vargas (SP) e escreve quinzenalmente em ÉPOCA
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