Muito interessante a matéria da revista Isto É desta semana (trecho abaixo), principalmente depois da queda de parte do Rodoanel em São Paulo. José Serra, governador paulista e pré-candidato mais badalado do PSDB para concorrer à presidência do Brasil, amargou uma semana após o acidente, queda nas pesquisas CNT/Sensus. Será coincidência?
Serra, assim como muitos políticos brasileiros, busca associar à sua imagem de gestor público eficiente a autoria de grandes obras e monumentos. A grande maioria das vezes, essas obras, sem desmerecer a importância e necessidade de muitas delas, são erguidas em detrimento de políticas sociais menos visíveis e palpáveis. São mais facilmente percebidas pela população, que também atribui maior valor imediato a elas que outras ações voltadas para a eduçação, saúde ou segurança.
Já tivemos oportunidade de presenciar, ao vivo e a cores, prefeitos de cidades importantes no norte do Brasil falarem que "é só asfaltar algumas ruas bem próximo das eleições que o povo vota novamente em mim ou em quem eu indicar". Assim, sem nenhuma vírgula a mais. Agem de forma estratégica, sabendo que o povo poderá até esquecer que fez um mal governo, se asfaltar sua rua, ou se fizer uma grande obra, às portas das eleições. E o povo acredita. Em 2008, Duciomar Costa, prefeito de Belém, amargava altíssimos índices de rejeição a alguns meses do primeiro turno e, literalmente, asfaltou seus adversários com obras dia e noite, feitas até às vesperas das urnas, e com farta colocação de placas anunciando que "é só esperar um pouco mais e votar em mim, porque as obras vão chegar até sua porta também". E, ganhou as eleições em segundo turno, com vantagem de quase 20% sobre seu adversário, José Priante. Após eleito, as obras praticamente pararam, e continuam assim um ano depois.
Nas próximas eleições ao governo do Pará, o candidato do PSDB, seja Jatene, Almir ou Mário Couto, certamente irá comparar obras e monumentos com o governo Ana Júlia. Estação das Docas, Hangar, Alça Viária, Ação Metrópole, Catedral, dentre outras, serão comparadas e avaliadas quais foram mais importantes. Se o PMDB tiver candidato próprio também vai lembrar das suas obras, assim como outros partidos que já tiveram experiências no poder executivo.
Obras precisam ser feitas, claro. Mas, de forma menos eleitoreira. Não precisa ser apenas às vesperas das eleições. Os eleitores devem estar atentos a isto. Seria muito bom que a população percebesse e cobrasse também outras políticas e ações públicas de seus gestores. Mas é difícil para muitos, principalmente os que têm baixa escolaridade, e que são a maioria.
Pesquisas recentes confirmam esse comportamento dos eleitores e mostram que a população das maiores cidades paraenses lembram mais do concreto, quando perguntou-se se "lembrava de alguma obra, serviço ou projeto em sua cidade?". Os mais citados, espontaneamente, foram obras físicas, de tijolo e cimento: reformas e construção de escolas, asfaltamento de ruas e estradas, construção de hospitais e delegacias, complexos de trânsito e transporte, obras do PAC, pontes, ginásios de esportes, praças, dentre outros. Ações de melhorias em segurança e educação foram pouco citadas, e menos lembradas ainda foram as ações estruturantes de planejamento econômico e geração de emprego e renda.
Não se pode esquecer também da baixa qualidade de muitas dessas obras, construídas "na correria para serem inauguradas antes das eleições", e que põem em risco a própria população, ou precisam ser feitos reparos imediatos com mais perdas dos recursos públicos.
Os Candidatos e Seus Monumentos
Da Isto É Online
Todo político brasileiro aposta em uma grande obra como cartão de visita eleitoral. Mas será que essa estratégia ainda funciona?
Por que os políticos brasileiros apostam tanto em obras? O desabamento das vigas do Rodoanel, a gigantesca via em torno de São Paulo, na sexta-feira 13, impõe esta questão com sua inevitável repercussão política.
Desde a década de 1960, quando o presidente Juscelino Kubitschek obteve sucesso com a construção de Brasília - e pretendia assim voltar ao poder -, esta estratégia passou a ser reforçada pelos candidatos a cargos majoritários em todo o Brasil e grandes obras sempre foram atreladas à agenda eleitoral.
Em meio século, muita coisa mudou no País. Duas deficiências brasileiras, no entanto, estimulam os políticos a manter essa anacrônica tática eleitoral. Uma delas é o persistente alto índice de analfabetismo, acima dos 11%, o terceiro maior da América Latina. O segundo é que, mesmo com tantas obras, a população brasileira também é a que amarga uma das menores coberturas de saneamento básico do continente.
Isso significa dizer que, em todo o território nacional, as obras que precisam ser feitas, até agora, são desprezadas porque dutos subterrâneos ninguém vê. A outra conclusão é que, para o perfil do nosso eleitorado, as grandes obras são a linguagem mais facilmente compreendida, sobretudo pela população de baixa renda.
"As obras públicas estão num melhor alcance da sociedade e são mais comentadas. Entram logo no cálculo de avaliação da gestão pública", lembra Luciana Fernandes Veiga, cientista política da Universidade Federal do Paraná. A menos de um ano da eleição, quando serão escolhidos presidente e governadores, em todo o País, há exemplos de candidatos mais preocupados em erguer monumentos do que em estabelecer alicerces de uma política de longo prazo, com planejamento, capaz de atender às imensas demandas sociais da população.
É legítimo o eleitor se perguntar por que um político brasileiro jamais elege como bandeira, por exemplo, um programa de segurança como o Tolerância Zero" adotado em Nova York pelo prefeito Rudolph Giuliani. "O político aposta na construção de obras públicas pois considera que, por melhorar a vida das pessoas, possa ter um retorno positivo na percepção do eleitorado", afirma Luciana. O resultado desta obsessão por obras é, muitas vezes, uma inversão de prioridades para atender a interesses políticos.
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