terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Mulher tem que ser braba mesmo?

O presidente Lula foi internado com hipertensão. O nome já diz: é tensão demasiada, dez compromissos em cinco cidades numa semana, levando na bagagem sua pré-pós-candidata, a ministra Dilma Rousseff. Num dia, Lula diz, orgulhoso, que “a bichinha está palanqueira”. Dias depois, em Pernambuco, pela primeira vez assume em comício o gênio forte da ministra: “As pessoas falam que a Dilma é braba. Vou lhe contar uma coisa. Mulher tem mais é que ser braba mesmo”.

Não sei o que será pior na campanha para Dilma: mudar ou não mudar o jeito, o tom, os temas. No fundo, colocou-se a ministra numa roubada. Seu amigo, o ex-guerrilheiro e ex-prefeito petista de Belo Horizonte Fernando Pimentel, afirma que ela deve assumir a fama de durona porque “tentar fazer Dilma parecer com Lula é ilusão”. É como diz Pimentel. Ela não é operária, não passou fome e não nasceu no Nordeste. É mineira de classe média alta, educada nos melhores colégios. Quando se apresenta a círculos menores, Dilma conta que o pai é búlgaro. Não dá para dizer isso em palanque. Búlgaro de quê?

O desafio cada vez mais claro e árduo de transferir votos para Dilma pode estar na raiz da hipertensão do presidente. Não é preciso ser médico para desconfiar. Porque, quando Dilma se acredita popular e se solta... aí mora o perigo. Em Pernambuco, conta a repórter de O Globo Letícia Lins, a ministra cometeu gafe após gafe ao inaugurar um posto de saúde ao lado de seu padrinho. Ela disse que o escritor Ariano Suassuna nasceu em Pernambuco – mas foi na Paraíba. Atribuiu a Suassuna a frase “nós somos madeira que cupim não rói”. A frase é do compositor Lourenço Barbosa, o Capiba. Errou o nome da cidade em que estava. Falou no prefeito “Romildo”, de Olinda. Só que ele se chama Renildo. Saudou Romero Jucá (PMDB) como líder do partido no Senado. Jucá é líder do governo.

Vamos dar crédito à ministra. É verão, faz muito calor. E o que lhe falta de traquejo lhe sobra em nervosismo. Não pode ser fácil mesmo tentar substituir Lula, o homem do povo que já governa o Brasil há quase oito anos e que, em Davos, na Suíça, receberia na sexta-feira o título de Estadista Global, caso a pressão não o traísse.

Não sei o que será pior para Dilma na campanha: mudar ou não mudar seu jeito e seu tom

O problema não são as gafes da ministra, ainda pequenas (quem será que está escrevendo os discursos de Dilma?). A pergunta é outra: o povo brasileiro quer mesmo uma dama de ferro no poder? Será que, como disse Lula, “mulher tem que ser braba”? “Quem tem que ficar arreganhando os dentes todas as horas é o homem. A mulher tem que ser séria mesmo”, disse Lula. As urnas dirão se o povo concorda. Como Dilma se comportará, atacada em debate? O marqueteiro João Santana terá de fazer mágica. Amigos dizem que ela tem treinado postura e discurso. Só faltaria escolher “temas mais populares, deixando de lado o tom técnico”.

Na festa de 100 anos de dona Maria Amélia, a mãe de Chico Buarque, no Rio, Dilma estava lá, ao lado de Lula. O presidente foi um sucesso. E a ministra? Os convivas dizem que ela se esforçou para demonstrar simpatia. Mas, em festa de bamba, clima pré-Carnaval, ninguém vai conversar sobre PAC, pré-sal ou etanol. Ou sobre “a comissão da verdade”. Nome complicado esse. Pois, se existe uma comissão da verdade sobre vítimas da repressão, imaginamos que as outras... Bem, as outras devem ser de mentirinha.

Lula, sempre galante em sua defesa de Dilma, chamou de “babaca” o presidente do PSDB, Sérgio Guerra, que não perde a chance de atacar o ponto fraco da ministra: “Foi ela quem liderou isso (o veto à suspensão de obras da Petrobras consideradas irregulares pelo Tribunal de Contas) . Ela quer mandar em tudo. É autoritária”.

É pouco? Vem aí um trio da pesada para o diretório nacional do PT. Todos réus do mensalão: José Dirceu, cassado em 2005 e ex-ministro da Casa Civil; José Genoíno, presidente do PT até 2005, obrigado a sair pelo escândalo; João Paulo Cunha, presidente da Câmara no primeiro mandato de Lula. Objetivo: costurar alianças e articular a campanha da Dilma.

Um trio de ferro para uma dama de ferro.

Por Ruth de Aquino / Época

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